Por mais que tente...

Sinto que me levaram todas as forças...Há um ano atrás, esperava ansiosamente que o telefone tocasse e que do outro lado me dissessem que o meu sobrinho estava a caminho. Tinha a mala feita para ir para Viseu a qualquer altura, bastava saber que a minha mana tinha dado entrada no hospital...Nessa semana, lembro-me de chegar do trabalho tarde e, mesmo cansada, ia pintar a fraldinha que tinha comprado com tanto amor para o Tiago... Queria dá-la no dia em que nascesse. Não tive tempo de pintar o nome. Não cheguei a dar.Era uma quinta-feira, o céu tinha as mesmas nuvens cinzentas, numa espécie de cenário para o que nos esperava... O telefone tocou mas, contrariamente ao que pensava, do outro lado ouvi a frase mais dura de sempre. Foi o dia mais triste que me recordo de ter vivido. O Tiago nasceu no dia 11 de Abril, sem vida...Tudo mudou, desde esse dia... De repente, muitas coisas que achava importantes perderam todo e qualquer sentido. Alteraram-se prioridades, aligeiraram-se expectativas, aprendi a sorrir de uma maneira diferente. Dava tudo de mim para nunca ter visto a minha mana e o meu cunhado destroçados daquela forma, dava a vida para nunca ter testemunhado aquela tristeza nos meus pais, dava o meu coração por um segundo de brincadeira com o meu sobrinho...Uma parte de nós foi com o Tiago para aquele imenso céu de onde nos olha, de onde nos protege, de onde acautela o irmãozinho que cresce na barriga da melhor mãe do mundo! É assim, não é? É assim que temos de pensar, não é? E se vos disser que não consigo? E se vos disser que também eu não tenho forças? Sinto que não as tenho nem para mim, nem para a minha irmã, nem para a minha família... Não tenho.Caiem-me as lágrimas e não vos consigo esconder a revolta que vai cá dentro!Porquê Deus? Porque é que permitiste uma tragédia destas? Porque é que continuas a permitir que famílias inteiras passem por esta dor corrosiva? PORQUÊ? Tu, Todo Poderoso, Aquele que faz a justiça divina, onde estavas? A Ti não te perdoei! Não sou pessoa de crenças mas sim de convicções. Como queres que acredite em Ti se levaste o meu sobrinho? Como queres que te dê valor se, insatisfeito, apressaste-te a roubar a minha pobre avó logo a seguir? Como queres que tenha fé em Ti se continuas a permitir que as mães continuem a sofrer desta maneira?!Por favor, alguém me diga como é que esta dor vai embora... Tenho tanto medo! Tanto, meu Deus! Juro que em nenhum momento deixo que o pensamento de que algo possa correr mal com o Afonso assole a minha cabeça. Mas tenho tanto medo. Tanto que sinto o coração gelar.Aos poucos, com a ajuda de verdadeiras heroínas desta vida, aprendi a ser tia de um anjo e acredito com toda a força do meu coração que vou pegar o Afonso no colo e dizer-lhe vezes sem conta que o amo. Vou olhar o meu sobrinho nos olhos (verdes como os do avô), vou abraçá-lo, vou sentir aquele cheirinho de bebé, vou chorar de alegria, vou gritar bem alto que ele é fruto de muito amor e de muita esperança. Joana